Entre as peças do acervo do Museu Histórico Antonio Granemann de Souza, encontramos uma fotografia ampliada com várias autoridades. Muitos visitantes, ao se depararem com essa imagem, ficam indagando quem seriam esses homens e o que a fotografia representa. Para elucidar essa recorrente dúvida, resolvi escrever sobre o assunto para facilitar a compreensão.
A questão dos limites no Sul do Brasil tem uma longa história de disputas. Iniciou-se em 1853, quando o Paraná, tendo como capital, Curitiba, foi elevado à categoria de província e herdou um território contestado. Esta área, localizada ao sul do Rio Iguaçu e ao norte do Rio Uruguai, abrangia inicialmente 28 mil quilômetros quadrados. A disputa não se limitou aos governos do Paraná e de Santa Catarina, mas também teve envolvimento histórico com a Argentina. Ao longo dos anos, as fronteiras foram se delineando conforme o povoamento da região avançava, porém, as dúvidas e as contestações persistiram, ampliando ainda mais a área disputada.
Conforme o professor e escritor Delmir José Valentini, foram anos seguidos de discussões, assinaturas de projetos e reclamações entre os dirigentes das duas províncias: “uma província alegava a posse e a outra alegava o direito, assim, até a Proclamação da República, onde as Províncias se transformaram em estados, nada estava definido” (1998, p.40).
Após a proclamação da República em 1889, a questão dos limites entre o Paraná e Santa Catarina não foi resolvida imediatamente por uma série de razões políticas, administrativas e históricas:
1. “Prioridades da República”: com a mudança para o regime republicano, o foco inicial estava na organização política do novo governo, na estabilidade interna do país e na consolidação da nova ordem política. Questões como demarcação de fronteiras entre estados poderiam ser consideradas menos urgentes frente a essas prioridades.
2. “Complexidade da Questão”: a demarcação de limites envolvia não apenas a delimitação geográfica precisa, mas também interesses políticos e econômicos locais. Ambos os estados tinham interesses territoriais e econômicos na área disputada, o que dificultava um acordo rápido e consensual.
3. “Falta de Resolução Anterior”: a disputa já existia há décadas antes da proclamação da República. A transição para um novo regime político não resolveu automaticamente questões antigas de fronteiras, especialmente quando havia controvérsias sobre a história e os direitos sobre o território em disputa.
4. “Negociações e Mediações”: resolver questões de limites requer negociações detalhadas e, às vezes, mediação externa para chegar a um acordo aceitável para ambas as partes. A ausência de um mediador eficaz ou de um processo de negociação formalizado pode ter contribuído para o prolongamento da disputa.
Esses fatores, combinados, resultaram na persistência da disputa de limites entre o Paraná e Santa Catarina por um período significativo após a proclamação da República. A resolução definitiva dessas questões muitas vezes exigia um compromisso político e administrativo que nem sempre era prioridade imediata no contexto pós-republicano do Brasil.
A assinatura do acordo de limites entre o Paraná e Santa Catarina em 1916 foi um marco importante na resolução da disputa territorial entre os dois estados. Após décadas de disputas e negociações infrutíferas, os governos do Paraná e Santa Catarina concordaram em buscar uma solução definitiva para a questão dos limites territoriais que se arrastava desde o século XIX.
O governo federal brasileiro desempenhou um papel crucial como mediador nesse processo. Por meio de iniciativas diplomáticas e pressões políticas, foram criadas condições para que os dois estados chegassem a um acordo.
Foi formada uma comissão demarcadora composta por representantes dos governos do Paraná e Santa Catarina, além de técnicos e especialistas em cartografia e geografia. Essa comissão teve a responsabilidade de estudar as áreas em disputa, analisar documentos históricos e realizar medições precisas no terreno.
Após intensas negociações e estudos, o acordo de limites foi finalmente assinado em 1916. Este acordo estabeleceu as fronteiras definitivas entre o Paraná e Santa Catarina, delimitando claramente os territórios de cada estado na área disputada ao sul do rio Iguaçu e norte do rio Uruguai.
A assinatura do acordo trouxe estabilidade e segurança jurídica para as regiões envolvidas, além de resolver um conflito que havia gerado tensões políticas e administrativas por várias décadas. A definição clara dos limites permitiu aos governos estaduais concentrarem-se em outras questões de desenvolvimento regional.
O acordo de limites de 1916 entre o Paraná e Santa Catarina foi alcançado após um longo período de disputas e representou um importante passo para a organização territorial e administrativa dos estados envolvidos.
O acordo de limites entre o Paraná e Santa Catarina foi assinado em Florianópolis, a capital de Santa Catarina. Este local foi escolhido por ser a sede do governo estadual catarinense e também por representar um ponto neutro e central entre os dois estados envolvidos na disputa territorial. A assinatura ocorreu em 16 de outubro de 1916, marcando o fim de décadas de conflitos e incertezas sobre a demarcação precisa das fronteiras entre o Paraná e Santa Catarina.
Estiveram presentes no ato da assinatura, representantes do governo federal e do próprio presidente da república Wenceslau Brás, na pessoa do jurista Tasso Fragoso, o governador do estado do Paraná, Affonso Alves de Camargo e o governador do estado de Santa Catarina, o engenheiro Felipe Schmidt. O acordo de limites entre o Paraná e Santa Catarina foi assinado pelos representantes dos governos dos dois estados envolvidos na disputa territorial.
Na visita ao estado de Santa Catarina, a comitiva do governador Affonso Alves de Camargo foi recepcionada em alguns lugares, com honrarias e homenagens. No dia 15 de outubro de 1916, um dia antes da assinatura oficial, os governadores foram recebidos no Club Militar de Florianópolis. Compareceram altas patentes do exército, da armada, senadores, deputados, ministros, prefeito do Distrito Federal. A festa iniciou-se com um magnífico concerto vocal e instrumental. Em seguida, foi servido um chá aos presentes.
O governador Felipe Schmidt, teve na sua mesa, à sua direita, o ministro do Exterior e à esquerda o ministro da Marinha. Já o governador do Paraná, Affonso Alves de Camargo, foi ladeado pelos generais Caetano de Faria, ministro da Guerra, e Luiz Barbedo, presidente do Club Militar.
No momento do champanhe, o general Barbedo saudou os dois governadores, enaltecendo o empenho pela solução na questão dos limites entre os dois estados. A imprensa catarinense estampou no mesmo dia que o governador do Paraná havia colocado objeções e condições para assinar o acordo no dia 16. Segundo os jornais, a condição principal seria que o acordo deveria valer somente após três anos após a assinatura. O governador Felipe Schmidt não aceitou tais condições, pois em três anos, os mesmos seriam substituídos e ninguém poderia garantir que esses sucessores aceitariam cumprir com os limites previamente estabelecidos.
Após a assinatura, os governadores estiveram presentes para uma fotografia no Salão Nobre do Palácio do Governo de Santa Catarina, juntamente com a maioria dos deputados da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, da 10.ª Legislatura e outros políticos da época. Na fotografia: Em pé, da esquerda para a direita: Dr. José Colasso, Dr. Carlos Júlio Renaux, Tavares Tijuca, Carlos Vítor Wendhausen, pessoa não identificada, Luiz de Vasconcelos, Celso Bayma, pessoa não identificada, Francisco Vieira da Costa (Major Vieira), Coronel Aristiliano Ramos, pessoa não identificada. Sentados: Coronel Manoel Tiago de Castro, Gustavo Richard, Caetano Vieira da Costa, Marcos Konder, Affonso Alves de Camargo (governador do Paraná), Felipe Schmidt (governador de Santa Catarina), Coronel Francisco Ferreira de Albuquerque, Fúlvio Aducci, Artur Ferreira da Costa, José Acácio Soares Moreira e José Boiteux.
Até a data desta publicação, essa fotografia não estava disponível em sites de pesquisas na internet, trata-se de uma raridade, depositada nas dependências do Museu Histórico Antonio Granemann de Souza. Para encerrar, esclareço aqui que até os dias atuais, há rumores de que os dois governadores, para assinarem o acordo do tratado de limites, teriam recebido cargos de ministros na gestão de Wenceslau Brás, essa informação não foi comprovada naquele momento. Affonso Alves de Camargo tornou-se Ministro de Ministro da Viação e Obras Públicas durante o governo de Artur Bernardes, entre os anos de 1922 e 1926. Assumiu o cargo seis anos depois da assinatura do acordo de limites. Já Felipe Schmidt, nunca foi ministro.
Para a questão específica dos limites entre Santa Catarina e a Argentina, o mediador foi o governo brasileiro, por meio de negociações diretas e tratativas diplomáticas com o governo argentino. Essas negociações ocorreram ao longo do tempo, tendo sido baseadas em tratados e acordos entre os dois países.
Referências:
Acervo do Museu Histórico Antonio Granemann de Souza de Curitibanos.
10.ª Legislatura. Memória Política da Assembleia Legislativa de Santa Catarina. On-line, disponível em: https://memoriapolitica.alesc.sc.gov.br/legislativo/deputado-estadual/legislaturas/105-10a_Legislatura
Recepção dos Drs. Felippe Schmidt e Affonso Camargo no Clube Militar. Jornal O Estado. Florianópolis, terça-feira, 17 de outubro de 1916. Anno II, Ed. n.º 434, p. 1.
VALENTINI, J. D. Da Cidade Santa à Corte Celeste – Memórias de sertanejos e a Guerra do Contestado. Caçador: Universidade do Contestado, 1998.
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