19 maio 2021

OS BAIRROS DE CURITIBANOS

Texto de Antonio Carlos Popinhaki


Há alguns anos, numa visita na sede da Secretaria Municipal da Educação de Curitibanos, fui instigado no meio de uma conversa com o atual prefeito Kleberson Luciano Lima:

— Você poderia escrever sobre a história dos bairros, as professoras estão sempre trabalhando com esse tema nas salas de aula.

Na ocasião, eu prometi pensar sobre o assunto. Tempos depois, conversei com outro pesquisador amigo meu, o senhor Sebastião Luiz Alves (in memoriam) e descobri que ele estava pesquisando e coletando informações para escrever sobre a história dos bairros curitibanenses. Eu fiquei contente, porque dessa forma, em breve, teríamos mais informações para ajudar as nossas crianças no conhecimento histórico local. Por fatalidade, o senhor Sebastião veio a falecer no dia 16 de maio de 2019 e não conseguiu concluir o seu trabalho. Não sei dizer, se ele ao menos, começou a sua pesquisa.

Parece mesmo que o assunto é de curiosidade geral entre os moradores, pois invariavelmente, alguém me pergunta sobre o crescimento urbano, bem como, do surgimento dos bairros e seus nomes. Então resolvi pesquisar e atender, mesmo que de forma abreviada, a demanda dos curiosos, inclusive, a minha, pois nunca antes me preocupei em pesquisar sobre esse assunto, o que vai na contra-mão das minhas investidas na busca do conhecimento histórico regional.

Para escrever sobre o crescimento da zona urbana foi preciso volver a minha mente para o passado, li e estudei um pouco da história do município. Com base nas informações, de forma bem sucinta passo adiante.

Não se sabe muito sobre a criação do povoado “Curitibanos”. Sabemos que o local já era conhecido por tropeiros do século XVIII, pelos campos e local apropriado para o descanso das tropas que seguiam do Rio Grande do Sul até o interior dos estados de São Paulo e Minas Gerais. Em 1777 foram criados postos de abastecimentos para atender as necessidades desses tropeiros que fizeram do local, caminho obrigatório para as suas tropeadas. Por aqui passavam também, mineradores, bandeirantes e aventureiros. Alguns provinham de Curitiba, por isso, com o passar dos anos, o nome ficou conhecido como “Campo dos Curitibanos”, “Pouso dos Curitibanos”, “Districto dos Coritybanos e Campos Novos Reunidos”, “Freguesia de Nossa Senhora da Conceição dos Coritybanos”, “Villa de Curitybanos”, “Comarca de Curitybanos”, “Município de Curitibanos”. 

A grafia também foi alterada, seguindo a ortografia adotada pelos habitantes de Curitiba de 1943. Antes se escrevia “Coritybanos” (terra de muitos porcos). Devido a uma confusão de grafia no entendimento da pronúncia e significado das palavras indígenas da tribo Tingui, os antigos moradores do Paraná. “Coré” (porco) e “Curiy” (pinhão), com a palavra “tuba” ou “tiba” (muito) fica: Corityba = muito porco, ou Curitiba = muito pinhão. Os curitibanenses alteraram a grafia, conforme ela foi mudada pelos paranaenses, visto que a própria história das duas cidades está ligada pelo nome. Curitibanos (terra de muito pinhão).

O povoado, com algumas casas edificadas próximas, começou a ser erguido e organizado no início do século XIX, pois na batalha ocorrida nas margens do Rio Marombas entre os homens do revolucionário Giuseppe Garibaldi e as forças imperiais (1840), foi citado pelo próprio Garibaldi, o nome “Coritibanos” nas suas memórias ditadas para o escritor Alexandre Dumas. “Coritibanos, espécie de colônia, estabelecida pelos habitantes de Coritiba, situada no distrito de Lages, província de Santa Catarina, era o teatro do episódio que estou contando”.

Não se tem muitas informações sobre as primeiras casas e os primeiros habitantes até esse evento que colocou o lugar nos anais da história. Cerca de vinte anos depois (1863), temos escritos em antigos jornais, que relatam a construção de uma pequena igreja para a invocação de Nossa Senhora da Conceição. Em 1851 o local ficou conhecido como “Districto dos Coritybanos e Campos Novos Reunidos”. Em 1864, foi alterado o nome para “Freguesia de Nossa Senhora da Conceição dos Coritybanos”. Em 1869, foi elevado à categoria de “Villa”. Em 1873 foi oficialmente realizada a primeira sessão da Câmara e houve o desligamento definitivo de Lages, tendo, inclusive, Presidente de Conselho e Juiz próprios. Em 1875 foi criada a Comarca e no ano de 1877, ela foi instaurada. No ano de 1891, por força da primeira constituição da república, foi institucionalizado o que conhecemos hoje por “Três Poderes”, ao mesmo tempo, em que foram instituídas as “Intendências”' e “Superintendências”, tendo Intendentes e Superintendentes como o “gestor executivo”, cabendo aos Estados a utilização ou não por um dos títulos. Em Curitibanos o gestor era o Superintendente. Finalmente, em 1938, através do Decreto-Lei n.º 86 obteve os foros de cidade.

No final do século XIX e início do século XX, a vila de Curitibanos cresceu por um instante, com poucas casas ao redor da pequena igreja e do colégio dos padres. Havia casas comerciais e vendedores autônomos, que comercializavam pelegos, montarias, novidades vindas do litoral e de Curitiba. Foram inauguradas gráficas impressoras que imprimiram os primeiros periódicos: “O Trabalho”, “O Planalto”, “Voz do Povo”. Esses jornalecos tinham disfarçadamente “cunho político eleitoreiro”. Existiam para expressar de forma escrita, criticas aos opositores políticos, levando ao acúmulo de intrigas e muitas vezes, a mortes por assassinato premeditado.

Em 26 de setembro de 1914, em meio ao conflito na região do contestado, houve uma invasão e incêndio na vila de Curitibanos, provocados por 200 homens sob o comando de Agustín Pérez Saraiva, o “Castelhano”. O prédio da Superintendência foi incendiado e destruído, bem como várias casas comerciais e residenciais. Algumas autoridades tiveram que fugir ou esconder-se com suas famílias devido a violência e truculência empregadas pelos invasores.

Passados esses tempos tenebrosos, gradual e lentamente a vila foi tentando retomar o crescimento natural. Lentamente, porque mais de dez anos depois do incêndio, havia poucas casas construídas ou reconstruídas. Houve um tempo de momentânea desolação. Isso se deu pelo fato de na época ser muito difícil a arte da construção, tanto a parte de madeira que era adquirida de forma rústica e artesanal em pequenos engenhos transformados em serrarias, como a parte de alvenaria que tinha obstáculos. Cal e cimento precisavam vir de Rio do Sul ou outro centro em cima de carroças por estradas quase que intransitáveis. A areia precisava vir do Rio Marombas, geralmente em cargueiros. Isso tudo demandava tempo. Uma casa de porte mediano e com algum conforto levava até quatro anos para ser construída.

As casas ergueram-se ao redor da pequena Igreja católica de madeira. Havia inicialmente três ruas principais. A Rua das Flores que hoje é a atual Rua Dr. Lauro Müller e parte da Rua Salomão Carneiro de Almeida que começava próximo à atual Praça Nereu Ramos e findava por onde hoje está o Banco Itaú. A segunda era a Rua Coronel Vidal Ramos que terminava na esquina onde hoje está o Banco do Brasil. A terceira rua era a atual Conselheiro Mafra que começava onde hoje é o Colégio Santa Teresinha (antes, antigo Convento dos Padres Franciscanos) e terminava na esquina da atual Rua Benjamin Constant, a mesma da esquina do Banco do Brasil. No lado esquerdo havia um antigo tanque onde as pessoas e animais se valiam da água em abundância. Essas ruas ficaram por um bom tempo sem nenhum calçamento. Caminhando, pisava-se na terra e em dias de chuva, o uso das botas e galochas era item obrigatório. Para frente dessas ruas seguia um caminho fundo, com barrancos laterais. As transversais que têm hoje os nomes de Rua Coronel Albuquerque, Rua Henrique Almeida e Rua Benjamin Constant chamavam-se de becos. As ruas principais eram cuidadosamente varridas diariamente, porque na periferia havia um denso vassoural e muito guamirim, precisavam dar utilidade para essa vegetação, além da confecção das vassouras, ainda eram roçados periodicamente, amontoados e queimados pelos trabalhadores da então Superintendência Municipal.

Assim, a cidade de Curitibanos foi crescendo lentamente. Com o passar do tempo havia capões de mato, árvores e araucárias que dividiam o centro da cidade com um pequeno aglomerado de casas que começou a formar-se na parte alta, ao sul. O local foi chamado de Vila Nossa Senhora Aparecida, hoje é o Bairro Nossa Senhora Aparecida. As casas foram se espalhando e se juntando, até que ficou um só aglomerado, um só centro urbano.

Os primeiros bairros foram denominados pelo prefeito Dr. Hélio Anjos Ortiz (in memoriam), através da Lei Ordinária n.º 539/1963, de 7 de novembro de 1963. Foram eles: Bairro do Bosque, Bairro Bom Jesus, Bairro Água Santa, Bairro Pessegueirinho e Bairro São Luiz.

Em 19 de dezembro de 1974, através da Lei Ordinária n.º 1135/1974, o prefeito Onofre Santo Agostini alterou o nome do Bairro Pessegueirinho para Bairro São José.

Nesse mesmo ano, a prefeitura fez uma doação de terras para a Secretaria da Educação do Estado de Santa Catarina para a construção de uma escola no Bairro da Balança, mas, aparentemente, não houve uma Lei que tenha criado tal bairro.

Em 14 de setembro de 1978, através da Lei Ordinária n.º 1392/1978, o prefeito Wilmar Ortigari (in memoriam), criou o Bairro "Universitário" Waldemar Ortigari, em parte devido à edificação e funcionamento da faculdade de ensino superior, a Fundação Educacional do Planalto Central Catarinense — FEPLAC, naquela região. A área antes pertencia ao território da Vila Nossa Senhora Aparecida, que não era denominada de bairro, mas como a cidade é uma só, por mais que não houvesse uma Lei Ordinária alterando o seu nome, tornou-se um bairro para todos os efeitos.

Em 15 de setembro de 1980, através da Lei Ordinária n.º 1462/1980, o prefeito Wilmar Ortigari, delimitou o perímetro dos bairros. Apareceram através dessa lei, os nomes dos bairros São Francisco e Bairro Getúlio Vargas.

Em 16 de dezembro de 2002, através da Lei Ordinária n.º 3555/2002, o prefeito Generino Fontana (in memoriam), criou o Bairro Santo Antônio de Pádua.

Outros nomes foram considerados bairros, mesmo que não houvesse na legislação local uma lei que tenha denominado esses lugares à categoria. Hoje em Curitibanos, para todos os efeitos legais, existem quatorze bairros. Centro, São Luiz, São José, Bosque, Santo Antônio de Pádua, São Francisco, Getúlio Vargas, Água Santa, Nossa Senhora Aparecida, Bom Jesus, Universitário, COHAB I, COHAB II e Bela Vista.

Chama a atenção a forte influência da Igreja Católica em Curitibanos, pois dos quatorze nomes de bairros existentes, sete deles levam os nomes de santos ou estão ligados à crença cristã católica.


Referências para o texto:


Curitibanos em 1907. Recorte do Jornal Correio dos Campos. Edição de 19 de julho de 1952.


Curitibanos. On line: Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Curitibanos


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 539/1963, de 7 de novembro de 1963. Dá denominação aos bairros da cidade.


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 1129/1974, de 24 de novembro de 1974. Autoriza doar terras ao governo do estado e dá outras providências.


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 1135/1974, de 19 de dezembro de 1974. Denomina bairro e dá outras providências.


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 1392/1978, de 14 de setembro de 1978,Cria Bairro.


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 1462/1980, de 15 de setembro de 1980. Delimita o perímetro dos bairros.


CURITIBANOS. Lei Ordinária n.º 3555/2002, de 16 de dezembro de 2002. Cria um bairro.


ALMEIDA, Coracy Pires de. Nossa Terra Nossa Gente. Gráfica Comercial. Curitibanos/SC. 1968. 134 p.


LEMOS, Alfredo de Oliveira. A história dos fanáticos de Santa Catarina e parte de minha vida naqueles tempos – 1913/1916. Passo Fundo: Gráfica e Editora Pe. Berthier, /s.d./.


EHLKE, Cyro. A origem do nome Curitibanos. Jornal “A Notícia” de 18 de fevereiro de 1971 - Hemeroteca Digital Catarinense. Curitibanos. On line: Disponível em: http://hemeroteca.ciasc.sc.gov.br/Cidades2/Curitibanos.html


Memórias de Garibaldi. Título Original: Mémoires de Garibaldi (1860). Editora Barbudânia.


POPINHAKI, Antonio Carlos. Curitibanos, o início. On line: Disponível em: http://antoniocarlospopinhaki.blogspot.com/2021/03/curitibanos-o-inicio.html


POPINHAKI, Antonio Carlos. Reminiscências. On line: Disponível em: http://antoniocarlospopinhaki.blogspot.com/2021/01/reminiscencias.html


PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA. Lei Provincial n.º 535/1864, de 22 de março de 1864. Distrito criado com a denominação de Districto dos Coritybanos e Campos Novos Reunidos.


PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA. Lei Provincial n.º 626/1869, de 11 de junho de 1869. Desmembra, eleva à categoria de Villa e denomina Freguesia de Nossa Senhora da Conceição dos Coritybanos.


PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA. Lei Provincial n.º 745/1875, de 19 de abril de 1875. Cria Comarca de Curitybanos.


SANTA CATARINA. Decreto-Lei n.º 86/1938, de 31 de março de 1938.

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